terça-feira, abril 18, 2017

Os seguidores do quê escondido

           
Admiramos, olhamos de perto-longe, fazemos torcida, somos fãs e tudo o mais que possa fazer peso no fato de seguirmos as pessoas, suas ideias e manias. E quando o mundo interior transparece? Quando conhecemos quem é a pessoa que tanto nos causou disposições de seguir cegamente, o que vem em questão?
              Seguir é o apanágio contemporâneo. Seguir, por que não seguir, o mantra. No intrincado das coisas possíveis, hoje, bem pouco apelo é preciso para se tornar um eleito pela multidão. Algumas características podem ser trabalhadas nesse quesito de atração.
   Pode-se ter uma aura acadêmica e desenvolver argumentos e ideias que o vulgo não compreende lá muito bem, mas que caem de maneira desconcertantemente bem audível, mesmo que não explique muito, mas é coisa de gente sabida, portanto, coisa a ser seguida. Ideia-pedra, que se admira como coisa-ídolo.
              Pode-se lançar mão de recursos comunicacionais. Escrever, ser da televisão, do rádio, do cinema, da internet, essas coisas-meios que provocam exposição e, logo de anônimo, tornar-se alguém que opina para o grande e vasto público que segue, replica, comenta, que é fiel. Fidelidade atualizada por força da postagem cotidiana, feita para renovar tendências, disposições, comentários, novas postagens. O individuo perde até sua característica mais essencial, deixa de ser-se para ser visto como o seguidor de... torna-se grife à sua revelia, será mesmo?
            Pode-se tornar aquele seguidor das máximas politicas úteis de momento. Nada muito refletido, mas de profundidade instantânea. Faça o teste. Observe por ai sobre o que e como se escreve a respeito da politica mais televisiva do momento. Verá que interpretes do cotidiano surgem aos montes e são cada vez mais eficientes em suas articulações de visibilidade.
            Pode-se lançar livros de autoajuda. Filão de muito prestígio, tendo em vista que muitas vezes esses personagens-autores podem figurar em meio diferentes para divulgar suas ideias-obras, na tv, nas redes sociais... E os efeitos são semelhantes: serem cifras, gerar milhões de seguidores, que nem sempre terão lido ou saberão de fato o que fez tal pessoa-número para gerar tanta repercussão.
            Pode-se tornar pessoa instantânea por meio de algum talento descoberto pelos olheiros que por ai estão a buscar novas atrações nos espaços de horários nobres que atrai multidões com outros produtos agregados. De toda forma, variações do mesmo tema.
            Como conviver nesse mundo de ilusões? Iludindo-se ou traçando um caminhar diverso?
            Provocação feita...

*  *
            Num segundo tempo de partida rica em percalços, irrompe um grito confundível com revolta ou mesmo coisa que o valha.
            - De que vale a torcida, se a partida está vendida?
            Quem ouviu não deu muito crédito. Lá no campo estavam dois mundos em luta. Antes o que era parte fundamental maior do que era a província e hoje a província emancipada, representada em seus times. Jogo caro para o simples mortal. Quem pagaria cem dinheiros para ver essa contenda? Alguns poucos para dizerem que estavam lá.
            Partida reiniciada e na bolsa de apostas estatísticas tendiam para os de casa. Grandes em tudo. Mas em nesse tudo vasto, quem viver verá, sempre. Vitória dos visitantes. Coisa mais sem jeito. Como pode ser? Na saída do estádio teve torcedor que ganhou ingresso que disse:
            - Esse foi o jogo que mais valeu a pena pagar pra ver. Com dinheiro dos outros, é claro...
              Placar final...
*  *  *
              Escondidos estão os sentidos dos eventos dos dias. A verdade é uma estratégia de autoengano, dizem. Naquilo que construímos em nosso tempo comum, vida urbana, privacidades, exposições, campesino viver, naquilo que são os propósitos que nos fazem ser. Fortalecemos certas maneiras, opiniões que nem sempre somos nós. Mas por conveniência das relações nos tornamos. Diante disso, o que está lá, guardado, coisa de tempos? O que está lá?
               No exercício da escrita qualquer mistério é terra preciosa. Seus segredos interessam como forma de imaginação de outros mais. Pensar os enredos escondidos de outras vidas. Pensar os resguardos de sociedades.
               Que capacidade tamanha essa de estar em outras vidas por meio de observação e escrita. Um exercício de vivências nada fácil, mas que não tira a vontade de estar sempre em atuação...

*  *  *  *

            As relações amorosas são desafiadoras hoje. Tenho muitas pessoas vivendo coisas afetivas que mereceriam ao menos um conto. Gente casada, gente que quer descasar, gente carente, gente cheia, gente que sonha amorosamente, gente magoada com essas coisas do amor. Amor-amor, amor-paixão, desamor, desejo, vontade, ilusão. Musas e musos por aqui, por ali, acolá. Essas coisas de sentimento-afetividade são mesmo inspiradoras. Existem relações explicitas, dessas mostradas em redes sociais como que para aprovação geral. E existem dessas relações escondidas, guardadas, nas entrelinhas dos dias. Essas são interessantes. São relações dentro de relações. Ou relações dentro de falsas relações. Mas existem aos montes. E aí podemos pensar nas dificuldades das coisas escondidas. O segredo e sua administração. Hoje quase tudo está passível de cair na dimensão do público. E isso é um perigo. E quais os atrativos da coisa em segredo? O olhar em segredo, o admirar em segredo, o desejar em segredo, o segredo de ter alguém, um ou outro alguém, em segredo.
            Vivemos mesmo uma vida liquida, como diria o sociólogo polonês Zigmund Bauman? Amores líquidos? A liquidez do nada certo, sólido, garantido?
            Serão risíveis amores românticos? Duradouros, para sempre?
            Quais as nossas caixas de segredos? O que elas contêm?

Assim como disse Camus: “Vou-lhe dizer um grande segredo, meu caro. Não espere o juízo final. Ele realiza-se todos os dias”.

Respiros:

- Qual o peso dos crimes de colarinho branco em nossa sociedade?
- Cuidado com sua vida a credito!
- Todos os dias descobrindo o escondido...
- Professor, professora, seja afetivo em sala.
- Andas sorrindo ou carrancudo?


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